DA IMPOSSIBILIDADE DA APLICAÇÃO DE PENAS DE CARÁTER PERPÉTUO AO SERVIDOR PÚBLICO
É
compreensivo que a Administração Pública ao impedir o retorno ao serviço
público de ex-servidor que tenha praticado infração funcional severa, vise atender
à moralidade administrativa, mas parece-me, à primeira vista, que tal punição
está em desacordo com a Constituição Federal, em seu artigo 5º, inciso XLVII,
alínea 'b', que expressamente veda a previsão e aplicação de penas de caráter
perpétuo, verbis:
Art. 5º Todos
são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos
brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito
à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos
seguintes:
[...]
XLVII - não
haverá penas:
[...]
b) de caráter
perpétuo;
Até
porque o princípio da moralidade administrativa, como todo princípio, não é
absoluto, devendo conformar-se com outros postulados, tais como os princípios
da dignidade da pessoa humana, da proporcionalidade e da razoabilidade, além do
direito fundamental ao livre exercício do trabalho.
No Supremo
Tribunal Federal e no Superior Tribunal de Justiça, há acórdãos no sentido da
impossibilidade da aplicação de penas de caráter perpétuo em esfera não
criminal. Vejamos:
EMENTA: -
DIREITO CONSTITUCIONAL, ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. PENA DE INABILITAÇÃO
PERMANENTE PARA O EXERCÍCIO DE CARGOS DE ADMINISTRAÇÃO OU GERÊNCIA DE
INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS. INADMISSIBILIDADE: ART. 5 , XLVI, e, XLVII, b, E § 2
, DA C.F. REPRESENTAÇÃO DA UNIÃO, PELO MINISTÉRIO PÚBLICO: LEGITIMIDADE PARA
INTERPOSIÇÃO DO R.E. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. 1. À época da interposição do
R.E., o Ministério Público federal ainda representava a União em Juízo e nos
Tribunais. Ademais, em se tratando de Mandado de Segurança, o Ministério
Público oficia no processo (art. 10 da Lei nº 1.533, de 31.12.51), e poderia
recorrer, até, como "custos legis". Rejeita-se, pois, a preliminar
suscitada nas contra-razões, no sentido de que lhe faltaria legitimidade para a
interposição. 2. No mérito, é de se manter o aresto, no ponto em que afastou o
caráter permanente da pena de inabilitação imposta aos impetrantes, ora
recorridos, em face do que dispõem o art. 5 , XLVI, e, XLVII, b, e § 2 da C.F.
3. Não é caso, porém, de se anular a imposição de qualquer sanção, como resulta
dos termos do pedido inicial e do próprio julgado que assim o deferiu. 4. Na
verdade, o Mandado de Segurança é de ser deferido, apenas para se afastar o
caráter permanente da pena de inabilitação, devendo, então, o Conselho
Monetário Nacional prosseguir no julgamento do pedido de revisão, convertendo-a
em inabilitação temporária ou noutra, menos grave, que lhe parecer adequada. 5.
Nesses termos, o R.E. é conhecido, em parte, e, nessa parte, provido.
(RE 154134,
Relator (a): Min. SYDNEY SANCHES, Primeira Turma, julgado em 15/12/1998, DJ
29-10-1999 PP-00017 EMENT VOL-01969-01 PP-00191)
........................................................................................................................
FUNDAÇÃO.
Curadores. Ação de destituição. Ministério Público. Legitimidade.
O MP tem
legitimidade para propor ação de destituição de curador de fundação, no
desempenho do seu dever de velar pelas fundações. O art. 26 do CCivil não foi
revogado pelo CPC de 1939 e está em vigor. A destituição, porém, não pode ser
em caráter "definitivo", como pena perpétua do exercício de direito
civil. Cerceamento de defesa inexistente. Recurso conhecido em parte, e nessa
parte provido.
(STJ, REsp
162114/SP, Rel. Ministro RUY ROSADO DE AGUIAR, QUARTA TURMA, julgado em
06/08/1998, DJ 26/10/1998, p. 122)
Conclusão
O Estado erra ao não aplicar o comando
constitucional que veda a fixação de
pena perpétua, negando cargos públicos aos que cometeram uma infração penal,
administrativa, civil, num remoto passado, tornando “letra morta” às garantias
fundamentais estabelecidas em nosso Estado de Direito.
Dra.
Cristiana Marques
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